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Vídeo Conferência DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

O CLUBE DE DISCUSSÃO na noite de 29 de outubro, na pauta das discussões voltadas ao desenvolvimento da cidadania, debateu tema técnico do Direito, contudo, simplificando a linguagem do advogado ao máximo possível, eis que dirigidas as considerações da advogada e consultora empresarial ELAINE RODRIGUES, ao público leigo também. A final, modernamente, a teoria da desconsideração da personalidade jurídica é aplicada nas lides do consumidor, nas demandas trabalhistas e no processo de execução fiscal. Em outras palavras, é interessante que se aborde o tema para todo público em geral e para a classe empresarial inclusive, para que melhor dimensione os riscos do negócio, além dos advogados e acadêmicos de direito, sempre afoitos pela atualização do tema proposto. E assim adentrou-se no tema:

No início, a teoria da desconsideração da personalidade jurídica mantinha-se por construção jurisprudencial.

Nascida no seio europeu de cultura anglo-saxônica, onde firma-se o direito pela construção jurisprudencial foi trazida pela vez primeira para o mundo jurídico do Brasil, pelas mãos do saudoso Professor Rubens Requião, catedrático do Direito Comercial.

A teoria foi rapidamente absorvida pelas procuradorias das Fazendas Federal, Estadual e Municipal, no afã de cobrar créditos tributários de empresas sonegadoras de tributos e desenvolveu-se muito bem na Justiça do Trabalho como forma de se dar efetividade ao processo de execução de sentenças trabalhistas.

Nessa pauta, com o advento do Código do Consumidor, positivou-se a teoria na Lei respectiva, seguindo-se modificações na Lei de Execuções Fiscais (Lei 6.830/80, artigo 4o. parágrafo 3o. c.c. artigo 29) e, por fim, no Código Civil (artigo 50) para absorvê-la e regrá-la. Mais recentemente, vê-se o acolhimento da teoria na legislação do Direito Ambiental, na Lei Antitruste e na Lei Anticorrupção.

Mas a final, no que consiste a desconsideração da personalidade jurídica?

Consiste na construção de uma fórmula legal de perseguir a responsabilidade dos administradores e proprietários de empresa, que usam a forma jurídica de empresa como escudo, para isentarem-se de responsabilidade econômica para com o pagamento de tributo, por exemplo; para burlar o ressarcimento de direitos trabalhistas lesados, ou ainda, para fraudar pagamento de dívida oriunda de qualquer outra responsabilidade patrimonial e, quiçá, criminal.

Talvez para o leigo pareça óbvio que se deva perseguir a responsabilidade do administrador ou do proprietário de empresa, quando essa é utilizada para sonegação fiscal ou contra o direito de crédito negado a pagamento. Contudo, nem sempre foi assim, porque o sistema jurídico vigente no Brasil até a pouco estava firmado na higidez do princípio da autonomia das pessoas jurídicas que, traduzindo em miúdos, significava que, havendo uma separação entre a pessoa jurídica e a pessoa do administrador ou do proprietário da sociedade constituída, a responsabilidade dos sócios estava, via de regra, restrita ao valor do capital investido na empresa.

Essa separação entre a vida da empresa e os interesses pessoais dos sócios funcionava então, como uma couraça protetora do patrimônio dos gestores de empresa em face do justo ressarcimento de prejuízos causados a terceiros, ou mesmo ao fisco por sonegação de tributos.

E fazendo prova de tudo quanto até aqui se afirmou, fez-se notar na web conferência por depoimento de participantes que, historicamente, se o patrimônio da empresa não solvia o débito, seu credor amargava o prejuízo, porque não podia pelo princípio da autonomia das pessoas jurídicas, perseguir patrimônio pessoal do administrador ou do proprietário e/ou sócio de empresa.

Nada obstante, ainda assim a desconsideração da personalidade jurídica para alcançar patrimônio pessoal do sócio de empresa veio ao mundo jurídico como medida de exceção. Em outras palavras, não deve ser aplicada senão frente prova irrefutável de que a empresa foi constituída para mera fachada, materializada como esquema fraudulento a Lei ou ao contrato, vertida para proteger abusivamente o patrimônio pessoal de seus sócios.

Considerando que a Constituição Federal determina no artigo 170 que a ordem econômica brasileira está fundada no trabalho e na livre iniciativa, assegurando-se a propriedade privada e o livre exercício de qualquer atividade econômica, fica fácil de entender o porquê a teoria, hoje positivada em vários estatutos legais, somente deve ser aplicada dentro de um contexto de fraude e abuso de direito.

Importante trazer ao conhecimento, recente decisão do Superior Tribunal de Justiça acerca da necessidade de demonstração de alguns requisitos (legais) para a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica.

PROCESSO CIVIL E DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE FALÊNCIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. INVIABILIDADE. INCIDÊNCIA DO ARTIGO 50 DO CC/02. APLICAÇÃO DA TEORIA MAIOR DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. ALCANCE DO SÓCIO MAJORITÁRIO. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. 1. Ausentes os vícios do art. 535 do CPC, rejeitam-se os embargos de declaração. 2. A ausência de decisão acerca dos argumentos invocados pelo recorrente em suas razões recursais impede o conhecimento do recurso especial. 3. A regra geral adotada no ordenamento jurídico brasileiro, prevista no artigo 50 do CC/02, consagra a Teoria Maior da Desconsideração, tanto na sua vertente subjetiva quanto na objetiva. 4. Salvo em situações excepcionais previstas em leis especiais, somente é possível a desconsideração da personalidade jurídica quando verificado o desvio de finalidade (Teoria Maior Subjetiva da Desconsideração), caracterizado pelo ato intencional dos sócios de fraudar terceiros com o uso abusivo da personalidade jurídica, ou quando evidenciada a confusão patrimonial (Teoria Maior Objetiva da Desconsideração), demonstrada pela inexistência, no campo dos fatos, de separação entre o patrimônio da pessoa jurídica e os de seus sócios. 5. Os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica somente alcançam os sócios participantes da conduta ilícita ou que dela se beneficiaram, ainda que se trate de sócio majoritário ou controlador. 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido. (Resp 1.325.663/SP, Relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 11.06.2013, DJe 24.06.2013).

Essa decisão judicial sintetiza o desdobramento da teoria sob estudo. Tem-se então a Teoria Maior da Desconsideração da Personalidade Jurídica, que engloba o comportamento abusivo do sócio, caracterizado pela confusão patrimonial ou o desvio de finalidade, e a Teoria Menor, adotada principalmente pelo Código do Consumidor (parágrafo 5o. do artigo 28), Leis Ambientais (exemplo Lei 9.605/88, artigo 3o. parágrafo único e artigo 4o.) e Legislação Trabalhista (artigo 899 da CLT). Aqui se apurará abuso de direito, excesso de poder, infração a Lei, encerramento ilícito de empresa, fato ou ato ilícito e violação dos estatutos da sociedade (contrato social).

Nas lides trabalhistas principalmente, uma vez ficando os créditos derivados da relação de trabalho a descoberto por insuficiência do patrimônio societário, sujeitam-se os bens dos sócios individualmente considerados, porém solidária e ilimitadamente, até o pagamento integral dos créditos dos empregados.

Nas execuções fiscais, também assim funciona a teoria em comento, relativamente a cobrança de tributos e das multas fiscais e administrativas, contudo com muitas queixas da classe empresária e de advogados empresariais, no sentido de que as Fazendas Públicas requerem a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica de forma abusiva. Entretanto os juízes das Varas de Execução sempre estão atentos, determinando que se esgote o patrimônio societário preliminarmente e a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica desde que se prove fraude a Lei Tributária ou abuso de direito ou confusão patrimonial, tudo mediante citação do sócio cujo patrimônio se pretenda invadir.

Relativamente ao Código do Consumidor, critica-se a forma como foi disposta a teoria que, no elenco das possibilidades legais de se aplicá-la, confundem a desconsideração da personalidade jurídica com hipóteses de responsabilidade civil por causar danos a terceiro ou ainda, de responsabilidade solidária e subsidiária do sócio pelos atos ilícitos que pratica.

De qualquer forma, é certo que a evolução da teoria, trazida para o Brasil em meados dos anos 80, não parou de evoluir.

A doutrina fala sobre a Desconsideração Inversa, que ocorre na eventualidade do devedor pessoa física, esvaziar seu patrimônio particular, transferindo os seus bens para pessoa jurídica da qual é sócio. Os exemplos contemporâneos mais comuns acontecem quando um dos cônjuges, prevendo um divórcio, retira do patrimônio do casal bens e os transfere para uma pessoa jurídica da qual é sócio, na tentativa de, em futura partilha, sonegar bens do casal ao cônjuge. Ou ainda, quando uma pessoa se utiliza da nova forma societária EIRELI (Empresa de Responsabilidade Individual), para agregar patrimônio pessoal em empresa de forma a escondê-lo de cobrança de dívidas pessoais, tais como de cartão de crédito e financeiras, dentre as dívidas pessoais mais comuns.

Efetivamente, esses contextos autorizam o Poder Judiciário a desconsiderar a autonomia da pessoa jurídica, alcançando os bens pessoais dos sócios nas sociedades empresárias agregados para, dessa forma, responderem por dívida pessoal.

O Superior Tribunal de Justiça, em 2010 (Resp 948.117), com acórdão muito elucidativo, decidiu pela aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica na forma inversa, quando identificou numa empresa que o devedor (sócio majoritário) passou o seu automóvel para o patrimônio da sociedade empresária. Contudo, apurou-se em juízo, que o sócio utilizava o veículo para fins particulares. O juiz autorizou a penhora desse veículo por dívida pessoal desse sócio.

É o desenvolvimento legal e jurisprudencial de nossos dias no tema, que recomenda cautela com relação às ofertas que trafegam por e.mail de blindagem patrimonial. Pode-se despender soma vultosa para consultores de blindagem de patrimônio e, no futuro, ainda amargar a aplicação judicial da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, perdendo para os credores, empregados e fisco, patrimônio pessoal agregado na sociedade empresária.

Nessa pauta de evolução naquilo que diz respeito à desconsideração da personalidade jurídica, é que ainda se apontam vozes da doutrina ampliando sua aplicação como penalidade nas licitações e pregões.

É que, por vezes, nos contratos administrativos de obras e serviços firmados pela Administração Pública em consequência de licitações ou pregões, pode-se, no decorrer da respectiva execução, verificar-se o descumprimento contratual. Nessa hipótese, a Lei de Licitações autoriza a rescisão do contrato e, dentre outras medidas de cunho administrativo, a pena de suspensão temporária de participação em certames públicos, bem como a declaração de inidoneidade para contratar com entes públicos.

Não é incomum nessas situações, as empresas penalizadas constituírem nova empresa, com nova sede social, mas com os mesmos sócios, para continuar trabalhando para o poder público. Esse comportamento configura abuso de direito e pode-se chegar na figura do sócio, impedindo a constituição de nova empresa com vistas a dar continuidade as contratações públicas.

O caso enseja o reconhecimento de fraude à Lei de Licitações e com essa constatação em procedimento administrativo, a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, fundamentando-se o gestor público, no argumento de que a prática viola os princípios da moralidade administrativa e da indisponibilidade do interesse público, de feitio constitucional.

Com efeito, não é lícito à Administração Pública compactuar com a fraude à Lei. E, de mais a mais, o princípio da eficiência, também de índole constitucional, obriga a Administração a desenvolver atividade administrativa eficaz e, em assim sendo, é eficaz para atingir o interesse público, que a Administração acolha a desconsideração da personalidade jurídica para evitar o abuso de direito.

A par disso, também não se pode esquecer o conteúdo da Lei Anticorrupção (Lei 12.846 de 2012, artigo 14) que prevê a desconsideração da personalidade jurídica na hipótese de sociedade empresária constituída para encobrir ou dissimular a prática de atos ilícitos. Inclusive, nessa legislação, se verificam artigos direcionados as pessoas que atentam contra o patrimônio público no que diz respeito às licitações e contratos administrativos (inciso IV alíneas “a” até “f” do mencionado artigo 14).

Por fim encerrou-se o debate sobre a Desconsideração da Personalidade Jurídica, voltando o assunto aos advogados e acadêmicos de Direito. Para esse público a parte processual da teoria importa muito e, nessa seara, a principal indagação foi se a aplicação da teoria exige o ajuizamento de ação de conhecimento específica para obtenção do título executivo em face do sócio cujo patrimônio será requisitado ao pagamento de seus credores.

Bem, entendeu-se que a alegação da desconsideração da personalidade jurídica é matéria de execução e, por isso, não exige que o sócio cujo patrimônio seja requisitado ao pagamento de credores tenha participado do processo de conhecimento que formou o título executivo contra a pessoa jurídica.

Ora, se possui-se documentação farta que configure os pressupostos autorizadores da desconsideração da personalidade jurídica, é só levar o fato aos autos da execução. Contudo, se a dilação probatória se faz necessária, daí não existe mágica, porque no processo de execução não há possibilidade legal de produção de provas que não sejam documentais. Não restará alternativa senão aquela de se promover um processo de conhecimento.

Da parte do sócio devedor, caberá nos autos da execução negar a existência dos pressupostos autorizadores da aplicação da teoria nos embargos do devedor, ou por meio de impugnação ao cumprimento de sentença, dependendo do caso (se se está frente a uma execução de título extrajudicial ou de título judicial), tudo em respeito aos princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, de modo a se preservar, enfim, a segurança nas relações jurídicas.

É o que se tinha para apontar sobre o tema. Esperamos que tenha sido elucidativo já que se sabe de antemão que não foi suficiente dada a extensão da proposta.

Fique atento ao próximo “Clube de Discussão” por videoconferência. Não perca essa oportunidade de se atualizar no conforto de sua casa ou de seu escritório!

ELAINE RODRIGUES é consultora empresarial do GABINETE JURÍDICO
Consultoria Empresarial e Treinamento
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